Foto: Reprodução

Anderson & Sheila: o que ainda nos torna humanos

Talvez o que mais nos falte, nesses tempos tão impacientes e tão duros, seja o pudor diante da dor do outro. A pressa em julgar, acrescentada da ânsia em expor e da facilidade com que se transforma sofrimento alheio em espetáculo; tudo isso diz menos sobre quem é alvo e mais sobre quem observa, publica ou comenta. Há uma crueldade disfarçada de curiosidade que vem corroendo a nossa capacidade de compaixão.

O anúncio feito pela Prefeitura de São José dos Campos, sobre a crise conjugal de Anderson Farias e Sheila Thomaz, é um comunicado institucional, sereno, respeitoso. E deveria bastar. Mas, como se tornou hábito, parte do debate público tenta extrair desse gesto íntimo alguma vantagem política, transformando o fato em uma narrativa conveniente, com novos motivos para atacar, ironizar, medir poder. Que erro lamentável, queridos.

É preciso reafirmar com firmeza e ternura: a vida privada não é patrimônio coletivo. Ser prefeito não é abrir mão da própria humanidade. E quem acredita que um rompimento familiar pode ser usado para desestabilizar ou vingar ressentimentos políticos ainda não compreendeu o que é servir ao público; porque servir é proteger, é cuidar, é saber os limites entre o que pertence à cidade e o que pertence ao coração.

A política perde sua dignidade quando se alimenta de intimidades. Nós, da imprensa, perdemos a nobreza da atividade quando confundimos a informação com intriga. E a sociedade perde sua decência quando celebra a dor de quem errou, do sofrimento de quem apenas vive o que qualquer um de nós pode viver um dia. Não há cargo, nem mandato, nem poder que nos isente da fragilidade de ser humano.

Anderson e Sheila seguirão seus caminhos. E espero que de alguma forma se reconciliem. A cidade seguirá o seu. Mas é preciso que nós, como comunidade, sigamos também; com mais empatia, respeito, e com menos julgamento. Os filhos; Mônica, João Henrique e Maria Eduarda merecem um ambiente onde a privacidade dos pais seja inviolável, eles não exercem cargos públicos, onde o silêncio ainda signifique cuidado. Reflitamos sobre isso, antes de tentar “viralizar” ou vilipendiar.

O que se espera agora não é curiosidade, é decência, compreensão. Que essa história nos sirva para lembrarmos que a verdadeira grandeza de uma sociedade não está em sua capacidade de investigar a vida dos outros, mas em saber resguardar aquilo que é sagrado: a intimidade, o afeto e a dignidade do ser e nunca do estar.

E talvez, se formos capazes de aprender isso, ainda haja esperança de que sejamos, antes de tudo: humanos.

Fabrício Correia é jornalista, escritor e professor universitário. Na vida pública, foi vereador (assumiu como suplente), secretário municipal, co-deputado estadual e presidente do Fundo Social de Solidariedade de São José dos Campos.

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