Foto: Reprodução

Charlie Kirk: o que está acontecendo com todos nós?

Há algo de profundamente inquietante no ar do nosso tempo. A morte de Charlie Kirk, trágica em si mesma, já seria suficiente para convocar silêncio, luto e a compaixão mínima que se deve a qualquer ser humano que cai diante da violência. No entanto, o que espanta é a reação de parte da chamada elite cultural brasileira, que em vez de se recolher diante da gravidade do episódio preferiu festejar a tragédia, relativizar o assassinato ou transformá-lo em contragolpe.

Intelectuais que admiramos, historiadores que formaram gerações de leitores, médicos e professores que deveriam carregar a dignidade do saber e da palavra, parecem ter se esquecido do seu papel essencial de guardiões da vida e da memória. O que deveria ser consciência crítica tornou-se eco de ressentimentos e apatia diante da dor.

Não se trata de defender as ideias de Charlie Kirk, nem de romantizar suas posições políticas, muitas vezes duras, controversas, homofóbicas e racistas. Trata-se apenas de reconhecer que a vida de qualquer pessoa é inviolável e que a sua morte não pode ser motivo de celebração. Quando comemoramos a violência contra um adversário, já não estamos combatendo as suas ideias, mas destruindo o próprio pacto civilizatório que sustenta a democracia.

A pergunta que nos persegue é simples e brutal: o que está acontecendo com todos nós? Onde se perdeu o senso mínimo de humanidade que nos ensinava que nenhuma vida é descartável, que nenhuma morte pode ser recebida com aplauso? É como se tivéssemos trocado o lugar da cultura, que deveria servir de ponte, pelo lugar da vingança, que cava abismos e multiplica rancores.

A barbárie não começa com armas na mão, mas com palavras que legitimam o ódio. A morte não se banaliza de um dia para o outro, mas a cada vez que alguém com prestígio público escolhe rir quando deveria se indignar. E quando os intelectuais se rendem a essa lógica, a sociedade inteira perde o seu norte moral.

O Brasil precisa reencontrar o sentido da palavra como gesto de vida. Precisamos de pensadores que iluminem, não que ensombreçam. De vozes públicas que apontem para a convivência, não para o extermínio simbólico do outro. A morte jamais pode ser espetáculo, assim como a violência jamais pode ser pretexto para qualquer resolução.

É tempo de recuperar a sensibilidade antes que ela desapareça de vez, até mesmo entre aqueles que deveriam ser os primeiros a defendê-la.

Fabrício Correia é escritor, jornalista, professor universitário com formação em História e Geografia pela Universidade do Vale do Paraíba. É especialista em Acessibilidade, Diversidade e Inclusão. Integra a União Brasileira de Escritores e apresenta na Jovem Pan, o programa jornalístico de entrevistas, “Conversa de Bastidores”.

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