A história tem caprichos, sutilezas e ironias que nem mesmo o mais inspirado dramaturgo poderia conceber. No teatro político brasileiro, há aqueles que partem porque o país se tornou inabitável para eles e aqueles que fogem porque se tornaram inabitáveis para o país. Jean Wyllys deixou o Brasil porque não havia mais como existir aqui. Eduardo Bolsonaro deixou o Brasil porque já não havia mais sentido em ficar.
Jean partiu para salvar a vida, Eduardo para salvar a narrativa. Jean renunciou ao mandato porque sua presença no Congresso transformava-se, a cada dia, em uma sentença de morte escrita em mensagens anônimas e miras nada metafóricas. Eduardo se licenciará porque, sem o cargo que almejava, restava-lhe apenas a humilhação de ser um deputado sem importância, abandonado pelo próprio partido.
Quando Jean Wyllys anunciou sua saída em 2019, a extrema direita celebrou, riu, desdenhou. Diziam que era covarde, que não aguentava o tranco, que fugir era coisa de gente fraca. Eduardo agora atravessa o mesmo Atlântico, mas para o lado errado da história. Não foge de ameaças, mas da irrelevância. Não se exila porque é um alvo, mas porque não tem mais onde se encaixar.
O Brasil nunca precisou de Eduardo Bolsonaro, e talvez essa seja a grande tragédia do filho 03. Cresceu sob a sombra de um sobrenome, aprendeu a fazer barulho sem precisar dizer nada de substancial, achou que ser um eco bastava para garantir seu lugar na política. Mas quando Valdemar Costa Neto, um homem que sobreviveu a escândalos e prisões, enxergou nele um peso inútil, o recado foi claro: o bolsonarismo já não precisava de Eduardo. O Brasil, este nunca precisou.
Jean perdeu o país, mas não perdeu a luta. O suplente que assumiu seu lugar foi David Miranda, um nome que carregava a mesma bandeira, que incomodava os mesmos setores, que enfrentava as mesmas batalhas. David morreu jovem, e Jean, que foi forçado a partir, permaneceu. O destino, sempre irônico, retirou do mundo quem mais queria ficar, mas seu legado permanece de forma altiva.
Eduardo, por sua vez, será substituído por Missionário Olímpio, um nome tão genérico quanto o papel que terá no Congresso. Um soldado menor dentro do exército da extrema direita, alguém que preenche vaga, mas não ocupa espaço. Enquanto isso, Eduardo se agarra à ilusão de que, nos Estados Unidos, conseguirá manter a pose de líder exilado, quando na verdade não é líder de nada além do próprio fracasso.
O problema do filho do ex-presidente não é Moraes, nem o STF, nem uma suposta perseguição. Seu problema é a ausência de um lugar no tabuleiro. Sem comando na Câmara, sem poder real dentro do partido, sem a menor perspectiva de futuro eleitoral, Eduardo se tornou um deputado sem função, um eco que perdeu o som. A fuga para os EUA é um artifício, uma forma de transformar uma derrota interna em um espetáculo de resistência, uma tentativa de evitar que o próprio esquecimento o alcance antes do esperado.
Jean Wyllys partiu porque ficou impossível viver. Eduardo Bolsonaro partiu porque ficou impossível fingir que ainda importava. O primeiro foi um incômodo para aqueles que não toleram a diferença. O segundo é incômodo até mesmo para aqueles que o criaram.
E assim, a história segue seu curso. Jean, um nome que permanece. Eduardo, um nome que tenta não desaparecer. Mas o tempo é implacável, e a irrelevância, essa sim, é um exílio do qual ninguém retorna.
Fabrício Correia é escritor, jornalista, historiador e professor universitário. Presidiu a Academia Joseense de Letras e integra a União Brasileira de Escritores – UBE. É CEO da Kocmoc New Future, responsável pela agência de notícias, “Conversa de Bastidores”.