A criação da Loteria Municipal de São José dos Campos não deve ser vista como uma aventura moral ou um atentado à fé cristã, como estão tentando imputar, principalmente por ter sido aprovada com o apoio de vereadores católicos e protestantes. Trata-se de um instrumento de gestão pública, amparado pelo Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a competência dos municípios para instituírem e explorarem serviços lotéricos. É, portanto, um passo legítimo e necessário para ampliar a capacidade de investimento da cidade em áreas essenciais como saúde, educação, cultura e assistência social.
O Projeto de Lei Complementar nº 12/2025 não abriu as portas para cassinos ou práticas obscuras. Elaborado pelo Poder Executivo cria um serviço público regulado, transparente e fiscalizado. Haverá mecanismos de prevenção a fraudes, políticas de compliance, proteção de dados pessoais e auditoria permanente do poder público. O que se busca é organizar um modelo de arrecadação que já existe no Brasil há décadas, mas agora com a garantia de que os recursos permanecerão em São José dos Campos, servindo à própria população.
É importante também desfazer um equívoco que circula em parte do debate: não se trata de ferir convicções religiosas. As bancadas católica e evangélica da Câmara Municipal tem plena legitimidade para defender os valores de sua fé e não encontra aqui qualquer afronta a isso. O projeto não macula a profissão de fé de ninguém. Pelo contrário, o que ele propõe é uma alternativa concreta para financiar políticas sociais que protegem famílias, amparam vulneráveis e ampliam oportunidades. São objetivos que dialogam com princípios de justiça e solidariedade, comuns a todas as tradições religiosas.
O verdadeiro ponto é este: se a loteria já existe como prática nacional, por que abrir mão de que São José retenha parte dessa arrecadação e a converta em benefícios locais? Cada aposta registrada, em vez de ser apenas um bilhete descartado, pode se transformar em novos leitos hospitalares, em bolsas de estudo, em incentivo ao esporte ou em apoio a programas culturais. É dinheiro que volta em forma de serviço público.
A loteria municipal não é sobre sorte. É sobre responsabilidade fiscal e compromisso social. Fazer da gestão pública um espaço de inovação, sem medo de enfrentar preconceitos ou discursos simplificadores.
Defender a criação da Loteria Municipal é defender nossa cidade. É reafirmar que o município não pode recusar caminhos legítimos de arrecadação em nome de visões parciais. E é, sobretudo, apostar naquilo que realmente importa: o bem-estar coletivo, a prosperidade da comunidade e a dignidade de cada cidadão.
Fabrício Correia é escritor, jornalista e professor universitário.